sexta-feira, 6 de novembro de 2009

- Rosa Amarela -

Óleo sobre tela - 50 x 70 cm - 2006
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Eu tenho uma teoria (aqui com os meus botões) que diz que, quanto menor for o lugar e menos acesso à arte este lugar tiver, o gosto popular pela pintura moderna, abstrata e expressiva também será sensivelmente menor em relação a arte representativa, o que é muito curioso. Curioso porque o gosto destas pessoas é moldado pelo bombardeio de influências da mídia, onde sempre aparece algum quadro abstrato numa sala ampla nas novelas brasileiras, principal fonte de apelo popular, e não acontecer isto no mercado de arte destes lugares me parece um paradoxo. Tratar disto é sempre comprar uma briga, ingresso vip pra uma discussão ferrenha entre artistas, críticos e admiradores de arte.



Em 2006, o proprietário de uma vidraçaria de Macaúbas onde eu emoldurava minhas telas me propôs um negócio. Eu pintaria as telas nos temas em que ele escolheria, ele as compraria por um preço menor do que o usual e depois ele revenderia para seus clientes. Ele já vendia diversas gravuras dos mais variados temas, mas havia me confessado que pinturas tinham mais procura. Pintar apenas pelo dinheiro nunca me atraiu (e confesso que não faz parte dos meus planos, ainda que seja ótimo quando isto acontece), mas resolvi fazer uma experiência, afinal, pintor também precisa de dinheiro pra viver. Nisto surgiu alguns problemas: 1º) Para isto, eu teria que pintar coisas como paisagens bucólicas, marinas com um barco velho na praia, flores (que quase sempre se resumiam a rosas e copos-de-leite), animais (que apesar da imensa variedade, quase sempre eram cavalos, cães, gatos e tigres), vasos, frutas e etc, motivos que não me atraíam nem um pouco; 2º) Pintar um mesmo tema várias vezes é muito monótono e o ato de pintar perde o sentido quando fazemos algo que não gostamos, que não estamos de alguma forma conectados... é quase como conviver com uma mulher que não gostamos; 3º) No meu caso, antes de pintar alguma coisa eu procuro por referências, tiro um monte de fotos de um monte de coisas, penso a pintura antes e para fazer este tipo de trabalho, eu teria que ter muitas referências; 4º) Onde eu arrumaria tempo para pintar tantas telas (caso as coisas progredissem)? Ou seja, haviam vários pontos contra.

Georgia O'Keeffe - Jack in the Pulpit nº IV

Mesmo assim, resolvi topar a proposta, mas para isto eu resolvi dar um jeitinho na forma como fazer o trabalho. Comecei então pelas flores! Pra isto, busquei inspiração no trabalho de Georgia O'Keeffe, pintora americana famosa por retratar flores de um jeito bem inusitado, focando como se estivesse quase dentro delas. Neste caso, a flor em questão é uma rosa amarela. Num close bem próximo, a pintura explora a simetria das pétalas que se ajeitam em espiral, recorrendo bastante às cores quentes. No final, trouxe uma sensação bem legal de alegria e o resultado foi muito bom, inclusive nas pessoas, já que a tela ficou muito pouco tempo exposta na vidraçaria. O acordo com este estabelecimento acabou não durando tanto, pois descobri que a minha paciência para pintar temas do tipo era curta, mas neste tempo saiu boas telas, ainda que poucas... talvez um pouco mais que uma dezena.


Licença Creative Commons
Rosa Amarela de Eduardo Cambuí Junior é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Vedada a criação de obras derivativas 3.0 Unported.

6 comentários:

  1. Bom Dia, Edú!
    É, meu amigo, vida de artista não é fácil, todos precisam de dinheiro. No entanto, haja paciência. Gosto de ver que você não perdeu o otimismo, pois mesmo não gostando desse tipo de trabalho, o resultado foi ótimo: cerca de mais doze produções. Aprecio a sua narrativa acerca da gênese da Obra, toda a busca feita para atingir a meta. A sua fonte de inspiração é sempre muito boa e, neste caso, excelente. Rosa amarela de pétalas simétricas, muito linda! O perigo de que a contempla demais é ficar totalmente hipnotizado e chamuscado.
    Gostei muito, Edú!
    Beijos e Boa Semana,

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  2. Adorei, pois assim que vi essa rosa me apaixonei, mas vou ter que voltar para ler com consciência.
    Beijos!!!

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  3. Oi Edu, tudo o que falaste é verdade. Em cidades menores as pessoas ainda preferem os temas paisagísticos, figurativos, etc, etc. Mas a Geórgia O'Keefe conseguiu desenvolver um trabalho belíssimo a partir do que existia em sua cidade, de uma maneira muito criativa, transformadora. Acho os quadros dela lindíssimos!
    Quanto à tua rosa amarela, acho que ficou muito boa. Não tens outros trabalhos dessa época para nos mostrar? "Home, rapaz, esse minino..."rrrsss
    Tô rindo, mas tô falando sério. Não ficaste com as fotos deles? Quero ver mais, please...
    Bjão

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  4. Respondendo:

    Renata: Oi, Rê! Obrigado pelas palavras! Realmente, minha cara... não é nada fácil essa vida de artista, seja escolhendo atender o gosto popular ou partindo pra pintar o que der na telha. Sobre falar da história de cada trabalho, de como e porque foi feito, etc, eu acho que é muito importante, afinal, uma hora ou outra sempre acaba sendo útil para alguém. Apesar de não gostar muito de pintar flores (porque eu acho que já tem gente demais fazendo isso), gostei de ter feito esta, porque ficou um pouco diferente. Às vezes precisamos encontrar uma saída diferente pra não cair no tédio! rs
    Bjão!

    Vanuza: Olá, Van!! Então, minha cara... essa pintura ficou legal mesmo!! Qualquer dia, vou ver se crio coragem pra pintar outras flores desse jeito. Bjão!

    Cirandeira: Oi, Maria! Também gosto bastante do trabalho da Georgia O'Keeffe, principalmente por ela ter retratado algo comum de uma forma bem criativa. Eu tirei fotos de alguns trabalhos dessa época (acho que de uns 4) e vou postá-los aqui nas próximas vezes... pode deixar!!! rs
    Bjão!

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  5. Voltei só para reler com muita calminha a sua exposição de motivos. Não me surpreendi e sabe por que? Porque és uma pessoa ética que sabe valorizar tudo na medida certa. Pintar ou fazer qualquer coisa só por grana, não dá!
    Boa semana aí em Macaúbas!!!Bjsss

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  6. Olá. Revela um ponto de vista correcto e perspectivas de actuação inteligentes. "Deu a volta aos temas estereoripados das paisagens....Boa reflexão que acaba por ser uma sugestão. No domínio da escrita, poesia, por exemplo, quem me dera que me propusessem escrever sobre isto ou aquilo, apesar de não gostar, mas seria um estímulo, pois gostaria de "viver só de escrever". O meio cultural e artístico, por aqui, é mesquinho e pseudo-elitista. Enviei um livro para imensas editoras e só uma me respondeu, apesar de não editar. Veja a falta de educação. Algumas são editoras consideradas boas, como pode ser?... Continue. Tudo de bom.

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