sexta-feira, 11 de abril de 2014

- Ponto de Leitura -

Acrílico sobre tela - 30 x 40 cm - 2013
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De tempos em tempos sou procurado por algumas pessoas de onde moro interessadas em aprender as técnicas da pintura em tela e até mesmo do desenho artístico. E assim, esporadicamente, eu abro um breve curso de introdução à pintura geralmente com turmas reduzidas, onde abordo o tema sempre usando bastante da história da arte, questões filosóficas sobre o assunto e a obra dos grandes mestres para ilustrar melhor o que é a pintura. Sempre surgem bons talentos, mas poucos dão continuidade à prática, talvez por conta do preço do material e porque grande parte dos alunos chegam presos na visão de lucro rápido com a venda de trabalhos, o que no Brasil é uma coisa dura de alcançar.

Alunos do curso de pintura
Mas falar de tudo isso antes de entrar no assunto desta pintura é porque ela foi iniciada como uma demonstração do último curso de pintura que ministrei, no início de 2013. Nestes cursos eu sempre faço uma pintura rápida demonstrando a técnica abordada para depois os alunos fazerem por si sós. A pintura em questão foi realizada numa aula sobre o tema "pessoas", na qual utilizei uma das alunas como modelo, mas sem me prender em retratar a pessoa... apenas para me situar do comportamento de uma pessoa lendo um livro. Mas diferente das outras pinturas que faço como demonstração, que geralmente são concluídas em pouco mais de uma hora, esta levou um tempo maior.


Durante a aula, eu comecei esta pintura e fiz grande parte dela, mas com a conversa fluindo ali na hora e com algumas outras ideias passeando pela minha cabeça naquele momento, acabei deixando para concluí-la depois, pois achava que a pintura estava precisando de alguma coisa a mais, que naquele momento ainda não estava claro nas minhas ideias. A imagem de uma pessoa lendo um livro com a obra de Norman Rockwell (artista abordei nesta aula) numa sala qualquer me pareceu um tanto pobre na composição. Quando retomei a pintura, achei que ficaria mais interessante se eu retratasse o ambiente real da aula, a sala principal da Fundação Cultural Prof Mota. A inclusão de um padrão (o desenho do piso da Fundação) ajudaria a quebrar a monotonia que teria se eu fizesse um ambiente fictício, além de ganhar um caráter documental. Não me preocupei muito em fazer o desenho do piso em simetria (algo que me arrependi mais tarde), dando mais atenção ao contraste que as cores dariam na composição final. Outra característica foquei bastante foi a iluminação do ambiente, principalmente através do brilho da luz da janela, das sombras nas paredes e um pouco do reflexo no piso fosco.

Fachada da Fundação Cultural Prof, Mota
A decisão de retratar o ambiente da Fundação Cultural Professor Mota veio por este ser um ambiente que há mais de quarenta anos faz as vezes de biblioteca e casa cultural em Macaúbas, mesmo com sérias limitações orçamentárias. Diversos grupos culturais locais (e de outros segmentos) já usaram o seu espaço, grupos e associações foram criadas nesta sala, reuniões sobre os mais diversos temas foram abrigados ali e uma infinidade de alunos e professores já folhearam o seu acervo bibliográfico, fruto da doação de parceiros e do empenho ferrenho do seu idealizador, o professor Ático Vilas Boas da Mota, filho do patrono homenageado pelo nome da instituição. Como sujeito esclarecido que é, o professor Ático faz de tudo para manter os padrões originais da fachada do imóvel, de importância histórica para o município. Recentemente a Fundação Cultural teve um projeto de clube de leitura aprovado pelo governo do Estado e passou a ter o título, oficialmente, de ponto de leitura.
"Judith" de Gustav Klimt
Por uma coincidência (que poderia muito bem ser interpretada como algo pensado), a utilização do padrão (do desenho do piso) contrastando com a figura de uma pessoa lembra um pouco um artifício muito usado por Gustav Klimt, que aqui fica ainda mais óbvio por conta do quadro pendurado na parede de sua pintura "Judith", mas na verdade o quadro (uma gravura pequena da pintura, emoldurada) realmente está nesta sala da Fundação, assim como outras gravuras emolduradas de obras de grandes artistas como Toulouse Lautrec, Picasso, Vermeer, Diego Rivera, entre outros.

"Ilhado", pintura que deu lugar a
"Ponto de Leitura"
Como eu já havia comentado em outras oportunidades aqui no Arte por Parte, acontece de vez em quando de sacrificar uma pintura antiga para que esta dê lugar a outra, ação que grandes mestres do passado também já fizeram, como por exemplo, Rembrandt. Foi o caso com esta pintura de hoje... a pintura foi feita sobre um trabalho antigo, feito quando eu estava iniciando na pintura e, portanto, fazendo diversas experiências. A pintura em questão chamava-se "ilhado" e retratava um homem no meio do mar. A ideia inicial deste trabalho foi o de simbolizar a solidão das pessoas nas grandes cidades, mas acho que não deu muito certo... talvez precisasse de mais dramaticidade no cenário. Na época eu também estava numa fase diferente, morando só em São Paulo, então acho que acabou ficando um trabalho de um caráter um tanto auto reflexivo.

Mas voltando ao assunto da pintura, o resultado agradou e algumas partes específicas ficaram muito boas, inclusive ao piso do salão que ficou bem interessante. Coincidentemente, esta pintura acabou servindo como uma experiência para uma outra tela que estava há ainda mais tempo 'de molho' esperando para ser concluída e que logo mais deve ser publicada por aqui, também tendo a leitura como tema principal.


Licença Creative Commons
Ponto de Leitura de Eduardo Cambuí Junior está licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição-SemDerivações 4.0 Internacional.

2 comentários:

  1. obrigado por partilhar teus belos trabalhos, meu "malcriado amigo" eduardo... são belos...
    aproveito para desejar-te uma ótima e próspera semana, enviando...
    beijos no coração...

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  2. Que maravilha de aula, Edu, e que trabalho interessante! Como eu gostaria de ter participado dela :)

    Um beijo

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